Eram quase duas da tarde do último dia 10, num patrulhamento de rotina no Parque Fleixal, no município de Guapimirim, na Baixada Fluminense, quando o cabo da Polícia Militar Luiz França teve sua atenção voltada para o chamado de um morador. A pessoa alertou sobre uma tragédia perto dali. França chegou até o local da ocorrência e percebeu que o portão estava aberto. Acompanhado de outros dois policiais, entrou na casa. Havia sangue espalhado na parede da sala. Ao lado do sofá, com os pulsos cortados em profundidade, uma jovem mulher sentada no chão. Ela apontou para um dos quartos, onde duas crianças estavam mortas sobre a cama. Ela gritava: “Matei os meus filhos, deixa eu morrer”.
As vítimas, Arthur Moisés e Bruno Leonardo Ferreira da Silva, de 3 e 6 anos, respectivamente, eram filhos da dona de casa Stephani Ferreira Peixoto, de 35. O cabo França, do 34º BPM (Magé), declarou em depoimento à 67ª DP (Guapimirim), que ouviu a confissão da mãe das crianças, testemunhada ainda por seu colega de farda e um policial civil. Este último, acionado por uma vizinha. França relatou que sentiu um forte cheiro de gás na casa. Ao chegar à cozinha, percebeu que todas as bocas do fogão estavam abertas, inclusive a do forno. Desligou tudo e colocou o botijão do lado de fora, por medo que explodisse.
Os médicos do Serviço de Atendimento Médico de Urgência (Samu) foram acionados, mas já era tarde. Só foi possível constatar as mortes dos meninos. Stephani foi estabilizada no local, mas como o caso era grave, precisou ser levada para o Hospital de Guapimirim. Do lado de fora da casa, chorando muito, sentado na calçada, estava o marido da acusada e pai das crianças, Carlos Leonardo da Silva, de 38 anos, sem coragem para ver o que aconteceu, mesmo chegando antes dos policiais no local.
Aos investigadores da delegacia de Guapimirim, Carlos contou que vivia há 15 anos com Stephani, com quem teve três filhos. Além de Arthur Moisés e Bruno Leonardo, tem o mais velho, com a idade do tempo que o casal mantinha a união estável. Em seu depoimento, o pai dos meninos disse que, no último dia 7, os cinco estavam em casa, quanto ela disse que iria ao mercado de carro. Ele contou ter se oferecido para saírem juntos com os filhos a fim de darem um passeio, mas que ela não aceitou.
Segundo Carlos, ela teria saído a pé, retornando três minutos depois. Ele disse que ela o agrediu de “forma gratuita”, com socos, tapas e pontapés. Para se defender, de acordo com suas declarações na delegacia, a segurou para afastá-la. Disse ainda que Stephani pegou uma faca para tentar atingi-lo, assim como ao filho mais velho. O adolescente, então, teria retirado a faca das mãos da mãe, conforme o relato de Carlos, que disse ter chamado a Polícia Militar. No entanto, ele afirmou que decidiu não fazer o registro, preferindo sair de casa. Essa já era a terceira vez que se separava de Stephani, mas eles sempre se reconciliavam.
No fim de semana anterior à tragédia, Carlos contou que enviou uma mensagem de texto no WhatsApp dizendo que queria ver os filhos. De acordo com seu relato, a mulher respondeu que ele só veria as crianças na Justiça. Na segunda, dia 10, ele pretendia ver um advogado, mas recebeu uma ligação dela em que anunciava ter matado as crianças e que estava tentando se matar, “mas não conseguia morrer”. Ele contou que, desesperado, pegou o carro e foi até a casa deles. Chamou a vizinha para acompanhá-lo, arrombou o portão, que estava trancado por um cadeado voltado para dentro, mas não teve coragem de entrar na casa. Daí, segundo ele, ficou esperando a polícia sentado na calçada.
No depoimento, ele disse que não imaginava que ela fosse ter coragem, por ser uma “boa mãe, pois fazia o dever dela normal de mãe”. Para ele, Stephani poderia fazer algo contra ele, pois, segundo seu relato, ela o ameaçou de “cortá-lo de cima até embaixo enquanto estivesse dormindo, mas não em desfavor dos filhos”.
Embora Carlos afirme que a Stephani tinha um temperamento agressivo, o exame de corpo de delito dela revelou algumas marcas nela pelo corpo. O laudo da perícia informa que ela tinha edema no nariz e múltiplas equimoses na mama direita. A acusada contou aos peritos que foi agredida a soco e cadeiradas pelo marido, no dia da briga que o casal teve, no último dia 7. Uma vizinha ouvida na delegacia, a mesma que chamou a polícia por causa duplo assassinato, contou que o marido dela, na noite do desentendimento entre Carlos e Stephani, ouviu gritos por socorro vindos da casa e que a voz era mulher.
A Justiça decretou a prisão preventiva de Stephani, que se reservou ao direito de permanecer calada. Ela se encontra internada no Hospital Psiquiátrico Roberto Medeiros, no Complexo Penitenciário de Gericinó, em Bangu.
Por O Globo