Menina estuprada aos 10 vira mãe, abandona escola e recusa terapia no Piauí

A vítima foi violentada em um matagal por um primo de 25 anos, em janeiro do ano passado. Imagem Ilustrativa

 Ao lado de uma mamadeira, sentada na cama, a menina hoje com 11 anos rapidamente se levanta ao avistar a presença do Conselho Tutelar de Teresina. Logo pega o filho de nove meses no colo, e sentada, se esconde por trás do menino.

Arredia, não diz uma só palavra. A família, que tinha na memória uma menina extrovertida que ia à escola e brincava de boneca, hoje convive com uma criança calada que não quer sair de casa.

Ela tinha dez anos quando engravidou após ser estuprada e seguiu com a gestação. A menina abandonou o colégio, vive conflito com a mãe e se nega a conversar com um psicólogo.

“O médico disse que não dava para tirar o bebê, que ela e a criança corriam risco de morte. Fiquei com medo e fui contra o aborto”, diz a mãe da vítima, uma dona de casa de 29 anos. A mulher não soube dizer o nome do profissional que deu à família a orientação sobre haver risco para ambos.

A vítima foi violentada em um matagal por um primo de 25 anos, em janeiro do ano passado. A mãe da menina descobriu a gravidez da filha fazendo um teste no posto de saúde de um povoado na zona rural da capital do Piauí.

Ela estava com quase dois meses de gravidez na época. Hoje o bebê está com oito meses e é cuidado pela avó. O estuprador tempos depois foi assassinado –a família não soube informar o que motivou o homicídio.

“Mudou tudo desde que o bebê nasceu. Ela está rebelde, já puxou faca para mim, faz ameaças de me matar, não vai para a escola, e disse que só quer ficar em casa. Estou cuidando de duas crianças, minha filha e meu neto. Ela não tem amadurecimento para ter filho”, diz a mãe da menina.

A família vive em uma casa de barro, com uma sala, um quarto e cozinha. O chão é de terra batida.

Lá moram sete pessoas: a mãe, o pai, a menina, seu bebê, e os irmãos da menina, de um, três e sete anos. O bebê, portanto, é apenas um pouco mais novo que o irmão caçula da garota.

Todos dormem em um único quarto entre camas, colchões no chão e redes. A mãe vive dos R$ 400 do Auxílio Brasil e ganha R$ 1 por cada cartela que vende de um sorteio premiado realizado em Teresina.

O Conselho Tutelar tomou conhecimento da gravidez da menina depois de uma denúncia da escola onde estudava.

A conselheira tutelar Renata Bezerra, do núcleo da zona sudeste, disse que o pedido de aborto legal foi solicitado informalmente à Justiça por ela mesma, por telefone à juíza plantonista, quando Bezerra acompanhava no hospital a criança e família.

Segundo Bezerra, no dia da consulta, a menina não queria a interrupção da gravidez.

“A vítima disse que não tirava o bebê [não faria o aborto]. Ela esperneou em frente da maternidade Dona Evangelina Rosa [para não fazer o procedimento]”, lembra a conselheira.

“Conversamos com a psicóloga da maternidade e o médico, que informaram que prevalecia a vontade da mãe do bebê. Ela estava com dois meses de gestação e daria para fazer a interrupção da gravidez. Acionamos a juíza de plantão por telefone e ela disse que a família teria que entrar em acordo para fazer o aborto”, explica.

O gerente de Direitos Humanos da Secretaria de Assistência Social de Teresina, André Santos, diz que, no primeiro trimestre de 2022, o número de casos de abuso sexual de criança e adolescente na cidade cresceu 55% comparado ao primeiro trimestre de 2021. O total saltou de 29 casos para 45.

“O que é mais complicado é que a vítima é menor de idade, diz que tem condições de cuidar do filho, se ela mesmo é incapaz de cuidar de si. Por isso sobrecarrega a família e a rede de proteção”, afirma Santos, para quem a rede de proteção infantojuvenil precisa ser mais ágil.

Daniela Neves Bona, defensora pública da 1ª Defensoria da Infância e Juventude de Teresina, esclarece que se a vítima de estupro e a mãe não querem o aborto é preciso respeitar essa decisão.

“A vítima tem livre-arbítrio. Agora, se ela não quer o filho e a maternidade não quer fazer o aborto, a família precisa procurar a defensoria ou um advogado para acionar a Justiça para obrigar o hospital a fazer a interrupção da gravidez”, diz Bona.

Bona afirma ainda que não é papel do Conselho Tutelar pedir aborto legal, e que o órgão pode apenas orientar a família e encaminhar a vítima para os projetos sociais para ampará-la.

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